Há pouco mais de seis meses, a Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou a chegada do novo vírus que em pouco tempo se tornou uma pandemia global.
Naquele dia, no final de janeiro, havia quase 10 mil casos relatados de coronavírus e mais de 200 mortes. Nenhum dos casos havia acontecido fora da China.
Desde então, o mundo e nossas vidas, mudaram profundamente. Como estamos lidando com a guerra entre a raça humana e o coronavírus?
Se olharmos para o planeta como um todo, o resultado não é bom.
Evolução do número de casos teve curva exponencial – Já nos aproximamos de 2019 milhões de casos confirmados e superamos 700 mil mortes. No começo da pandemia, demorava semanas até se registrarem cada 100 mil casos. Agora esse marco é atingido em questão de horas.
Como convencer as pessoas a lavar as mãos? Causar nojo nelas parece ser o jeito mais eficaz
“Ainda estamos no meio de uma pandemia intensa e muito grave”, diz Margaret Harris, da OMS. “Está presente em todas as comunidades do mundo.”
O impacto da covid-19 é diferente pelo mundo afora, e é fácil cada pessoa ignorar o que acontece no resto do mundo, fora de seus próprios países.
Mas um fato une todo mundo, desde quem vive na floresta amazônica, nos arranha-céus de Singapura ou nas ruas do Reino Unido: este é um vírus que prospera com o contato humano. Quanto mais nos aproximamos, mais fácil é a contaminação. Isso segue tão forte hoje em dia quanto no dia em que o vírus surgiu na China.
Esse ponto central explica a situação de todos no mundo e sugere como será nosso futuro.
É o que provoca o grande número de casos na América Latina – o atual epicentro da pandemia – e o surto na Índia. É o que explica o porquê de Hong Kong estar mantendo pessoas em centros de quarentena ou da Coreia do Sul de estar monitorando contas bancárias e de telefone de seus cidadãos.
É o que leva a Europa e a Austrália a terem dificuldades em equilibrar o final das quarentenas com a contenção da doença. E é o porquê de estarmos buscando “um novo normal”, em vez de voltarmos ao “velho normal”.
“Esse é um vírus que circula por todo o planeta. Ele afeta cada um de nós. Ele passa de pessoa para pessoa, e sublinha o fato de estarmos todos conectados”, diz Elisabetta Groppelli, da St George’s University of London.
Até o simples ato de cantar juntos pode espalhar o vírus.
O vírus também se provou especialmente difícil de rastrear, com sintomas leves ou até inexistentes em várias pessoas, mas mortal suficiente em outros, capaz de lotar hospitais.
“É o vírus pandêmico perfeito para nossa era. Nós agora vivemos na era do coronavírus”, disse Harris.
As melhores chances contra o vírus até agora foram nas tentativas de se conter a disseminação do vírus de uma pessoa para outra.
A Nova Zelândia é onde isso mais chamou atenção. O país agiu cedo, quando ainda havia poucos casos: com quarentenas e fronteiras fechadas. Agora praticamente não há mais casos e a vida voltou ao normal, em grande parte.
Atenção para coisas básicas também ajudam em países pobres. A Mongólia tem a maior fronteira de qualquer país com a China, onde o surto começou. No entanto, não foi registrado, antes de julho, qualquer caso de internação em UTI. Até agora só foram diagnosticados 293 casos, com nenhuma morte.
“A Mongólia fez um ótimo trabalho com recursos muito limitados. Eles fizeram um trabalho exaustivo de epidemiologia, isolando casos, identificando contatos e isolando esses contatos”, afirma o professor David Heymann, da London School of Hygene and Tropical Medicine.
Eles também foram rápidos em fechar escolas, restringir viagem internacional e promover o uso de máscaras e higienização das mãos.
Por outro lado, Heymann argumenta, a “falta de liderança política” abalou muitos países em que “os líderes na saúde e na política têm dificuldades de conversar juntos”. Neste clima, o vírus prosperou. O presidente americano, Donald Trump, e a maior autoridade em doenças infecciosas do país, Anthony Fauci, claramente estiveram em lados opostos nesta pandemia.
O presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, se juntou a manifestações contra a quarentena e descreveu o vírus como “gripezinha”, dizendo que a pandemia estava quase no fim em março.
Ao invés disso, o Brasil teve 2,8 milhões de casos e mais de 100 mil mortos.
Mas os países que conseguiram se impor contra o vírus – na maioria com quarentenas dolorosas que machucaram as sociedades – estão descobrindo que o vírus não sumiu, e que ele vai continuar voltando se nós relaxarmos. A normalidade ainda está muito distante.
“Estão descobrindo que é mais desafiador sair da quarentena do que entrar nela”, diz Groppelli. “Eles ainda não pensaram sobre como podemos coexistir com o vírus.”
A Austrália é um dos países tentando achar um caminho para sair da quarentena, mas o Estado de Victoria agora está em estado de “desastre”. Melbourne voltou para quarentena no começo de julho – com o contágio crescendo – e desde então impôs regras mais rígidas. Agora há um toque de recolher e as pessoas só podem se exercitar dentro de um raio de cinco quilômetros de suas casas.
A Europa também está reabrindo, mas Espanha, França e Grécia registraram recentemente o número mais alto de casos das últimas semanas. A Alemanha está com mais de mil casos por dia pela primeira vez em três meses.
O uso de máscaras, algo estranho antes, agora é lugar comum na Europa, até mesmo com resorts insistindo na prática.
E como alerta para todos nós – sucessos passados não são garantia para o futuro. Hong Kong foi muito elogiada por resistir à primeira onda de coronavírus – agora bares e academias de ginástica fecharam novamente, enquanto a Disneyland do país conseguiu reabrir por apenas um mês.
“Deixar a quarentena não significa voltar às velhas práticas. É o novo normal. As pessoas ainda não entenderam esse recado.
A posição da África na luta contra o coronavírus segue uma questão em aberto. Houve mais de um milhão de casos; depois de um começo bem-sucedido, a África do Sul parece estar em má situação, registrando a maioria dos casos do continente. Mas com poucos testes, é difícil ter um retrato fiel da situação.
E existe o enigma do notório baixo índice de mortes comparado com o resto do mundo. Eis alguns motivos que podem explicar isso:
As pessoas são muito mais jovens, com idade média de 19 anos na África; e a covid-19 está associada a pessoas mais velhas.
Outros tipos de coronavírus são mais comuns, e isso pode oferecer uma espécie de proteção.
Problemas de saúde comuns aos países ricos, como obesidade e diabetes do tipo 2, que aumentam os riscos da covid-19, são menos comuns na África.
Alguns países estão inovando na sua resposta à doença. Ruanda tem usado drones para entregar material para hospitais e divulgar restrições para a população. Eles estão sendo usados até mesmo para flagrar pessoas que estão desrespeitando as regras, como aconteceu com um pastor que estava indo para missa.
Mas em vários lugares, como na Índia, o acesso à agua limpa e saneamento prejudica até mesmo coisas triviais, como a higienização das mãos.
“Há pessoas que têm água para lavar suas mãos e há os que não têm”, diz Groppelli. “Essa é uma diferença grande, nós podemos dividir o mundo em duas categorias. E há grandes dúvidas sobre como controlar o vírus sem que haja uma vacina.”
Quando isso tudo vai acabar?
Já existem tratamentos com remédios. A dexametasona – um esteroide barato – teve bom resultado com alguns pacientes em estado grave. Mas não é suficiente impedir que pacientes morram de covid-19 ou dar fim às quarentenas. Atenção especial será dada para a Suécia nos próximos meses para entender se a estratégia do país funcionou no longo prazo. O país não impôs quarentena e até agora teve uma taxa de mortes significativamente maior do que a dos países vizinhos, depois de fracassar na proteção em lares de idosos.
Em geral, a esperança do mundo de ver a vida voltar ao normal está ligada à descoberta de uma vacina. Imunizar as pessoas impediria a disseminação do vírus.
Seis vacinas estão entrando na fase três de testes clínicos. Essa fase é crítica, quando descobriremos se as vacinas promissoras realmente funcionam. Esse obstáculo final já derrubou muitos remédios no passado. Autoridades de saúde dizem que devemos continuar falando em “se” a vacina vai funcionar – e não “quando” a vacina vai funcionar.
A doutora Margaret Harris, da OMS, diz: “As pessoas têm essa crença holiwoodiana em uma vacina; que os cientistas vão arrumar tudo. Em um filme de duas horas, o final chega rápido, mas os cientistas não são Brad Pitt se injetando e dizendo ‘nós vamos todos nos salvar’”.